Em pauta!

sábado, dezembro 19, 2015

[N! 9 Anos] A comunidade do anime em Portugal

A chamada da vez.
Opa!

Ora pois, seja bem-vinds a mais um post deste especial de aniversário do NETOIN!. Antes de mais nada, vou aproveitar a ocasião para fazer uma breve apresentação. Chamo-me Luis, mais conhecido online como "Blue" ou "Blue-kun", tenho vinte e seis anos de idade e, embora seja brasileiro, passei sete anos da minha vida (correspondentes à minha adolescência) em Portugal, lugar onde comecei a me interessar pela animação e pela cultura japonesa, de modo geral. Foi com base nesta experiência que o nobre Carlírio me perguntou se estaria interessado em participar desta iniciativa, e apresentar um pouco do lado "lusitano" do fandom para a galera daqui.

Para facilitar a leitura, decidi dividir o texto em algumas tópicos, abordando pontos que acho que são de destaque dentro do assunto, além de tecer comparações com o meu conhecimento da comunidade brasileira quando possível. Espero que você desfrute da leitura. E sinta-se à vontade para comentar com dúvidas ou perguntas acerca do tema.

1. A progressão do anime em Portugal

Saint Seiya não teve um real sucesso em Portugal.
Quando penso em anime no Brasil, especialmente para a galera da minha geração, a primeira coisa que vem à cabeça são os Cavaleiros do Zodíaco (Saint Seiya). Para os mais novos talvez o fenômeno seja um pouco menos forte, mas me lembro vivamente da minha infância, e de como aquela animada música de abertura interpretada pela Larissa e William (que para muitos continuam a ser Sandy e Junior, mas isso é papo para um outro momento) me deixava grudado no televisor. Ainda nos dias atuais, quando o assunto cai em desenhos animados que marcaram época, mesmo aqueles que juram de pé junto que não gostam de anime acabam dando o braço a torcer e recitando algumas das linhas mais famosas da série.

Os guerreiros de Kurumada, infelizmente, nunca atingiram a mesma popularidade em Portugal. A primeira transmissão foi interrompida após serem exibidos apenas trinta e seis episódios no canal RTP, por conta de queixas contra o conteúdo violento da série. Felizmente, o trono foi ocupado por outro monstro da animação japonesa, sendo este Dragon Ball.

Exibido pela primeira vez em 1995, a série de Toriyama foi um sucesso estrondoso, e em especial a continuação, Dragon Ball Z, que pode ser facilmente considerada de um dos mais importantes programas da história da televisão lusitana. Crianças e adolescentes deixavam as suas obrigações de lado para acompanhar as aventuras do Goku. E a popularidade do programa continua tão forte que, mesmo hoje em dia, o canal “Sic Radical” continua a exibir reprises das mais variadas séries da franquia quase todas as manhãs. Aliás, embora não possa confirmar isto com toda a certeza, acho que desde a sua estreia (na década de 1990) não houve nenhum período em que Dragon Ball tenha deixado de ser exibido em Portugal.

Slayers.
Este sucesso, é claro, abriu as portas para outros animes. Mais ou menos durante a mesma altura em que a série era exibida, Sailor Moon também fez furor em Portugal, sob o nome de Navegantes da Lua. Posteriormente, Rurouni Kenshin (como Samurai X) também alcançou relativa popularidade no “Batatoon”. Durante a década de 1990 e o início dos anos 2000, basicamente, a programação da TV aberta portuguesa incluiu diversas séries de animação japonesa. Slayers (exibido como Reena e Gaudy, já que teve os direitos comprados aos espanhóis), Card Captor Sakura, Pokémon, Digimon, Evangelion e tantos outros são alguns destes títulos.

A influência de Dragon Ball não parou apenas nos programas que foram exibidos. A dublagem portuguesa da obra de Toriyama, produzida pelos estúdios NOVAGA, tornou-se uma referência na área. Com um humor tipicamente nacional, o script substituía linhas menos importantes com todo o tipo de pequenas piadinhas, que faziam referências a expressões coloquiais (ou a programas famosos da época, como o popular show de auditório “Big Show SIC”).

A recepção foi tão positiva que o estilo criado foi adotado por outras séries (como os próprios Cavaleiros do Zodíaco, que em 1998, ganharam uma nova dublagem e voltaram à televisão, seguindo desta vez a linha introduzida por Dragon Ball). Isso rendeu episódios em que o nosso sempre popular cavaleiro Hyoga perguntada ao seu mestre se este conseguia “ver o seu pato”, enquanto utilizava o seu ataque, ou então a incríveis provocações no meio das lutas como “já tomaste as tuas vitaminas?”.

Se você riu com o texto, não perca a oportunidade de ver 
estas pérolas também em vídeo

Doraemon foi exibido no canal Locomotion em Portugal.
Vale citar que esta “época de ouro” também se alastrou para a televisão por assinatura, que começou a ganhar força na época. O Locomotion, canal bem conhecido da galera por aqui, foi um dos que levou diversas séries mais 'adultas' ao público luso, e o “Panda”, que continua na grade até hoje, transmitiu diversas séries icônicas ao longo de sua existência. Doraemon, Ninja Hattori, Captain Tsubasa J, Rayearth, Lost Universe, Sakura, entre outros animes, tornam a lista de animes exibidos bem extensa.

Atualmente, no entanto, a situação não é tão animadora. Tal como acontece no Brasil, os canais generalistas (de transmissão normal e variada na grade aberta) tiveram os seus espaços para animes muito reduzidos, havendo ainda a popularização dos desenhos animados americanos, que ocupam cada vez mais os já escassos espaços dedicados à programação "infantil". Além disto, com a internet se tornando numa ferramenta tão importante, além do surgimento de fansubs e sites como o Crunchyroll, o público que dependia da televisão para assistir este tipo de conteúdo agora tem outras alternativas para sanar tal vontade.

2. Dificuldades em encontrar material em português

Dragon Ball: um dos raros sucessos dos animes em Portugal.
Apesar da presença da animação na televisão, os fãs portugueses (ao contrário dos brasileiros) sempre encontram alguma dificuldade quando o assunto é gastar dinheiro em produtos das séries das quais tanto gostam. Por se tratar de um país pequeno (com apenas dez milhões de habitantes), é difícil encontrar um número suficiente de pessoas interessadas num produto de nicho, o que de certa forma inviabilizou tentativas de trazer esse tipo de material para Portugal de forma legal. Para tratar do assunto, resolvi pedir ajuda a um bom amigo meu, grande fã de animes há décadas. Segue, abaixo, uma explicação mais detalhada da situação, cortesia do Diogo Martins, mais conhecido como "Tsumori".

Adquirir mangá em Portugal nunca foi fácil. A maioria do número pequeno de localizações portuguesas foi lançada num formato pouco convencional, a dos fascículos mensais lançados em quiosques, pelo que são impossíveis de encontrar à venda em qualquer nos dias que correm. Como tal, a única opção sensata para adquirir mangá é comprar livros importados, mas para quem não se sente confortável a realizar a própria importação, não existem muitas opções disponíveis”.

One Piece: o anime também chegou até Portugal.
As poucas lojas que vendem manga importado em Portugal estão, na sua maioria, localizadas nas duas maiores cidades do país, Lisboa e Porto. E para além da seleção não ser variada, ainda existem as barreiras linguísticas e monetárias. Os livros que se vêem à venda encontram-se geralmente em inglês ou francês, pelo que o domínio de pelo menos uma dessas línguas é essencial para ler manga adquirido dentro do País. Para além disso, cada livro é geralmente vendido por preços superiores a dez Euros, o que causa uma despesa bastante elevada para quem queira adquirir vários volumes de uma série”.

Esta situação permanece desde os anos 1990, e não há qualquer indicação que possa mudar um dia, dado que a maioria dos fãs existentes em Portugal não aparenta ter interesse em adquirir mangá legalmente e contenta-se com as traduções de fãs disponíveis online. O mercado não pode crescer quando nem sequer existe”.

O último parágrafo do texto do Tsumori, em especial, merece algum destaque, e é algo que tanto eu como ele temos vindo a presenciar ao longo dos anos. Esta "falta de interesse" dos fãs, motivada pela dificuldade em encontrar os produtos e com a facilidade da Internet, parece ser uma das razões que levaram ao estado atual da comunidade, ponto que abordo no meu próximo tópico.

3. A comunidade

A face séria do Naruto diz tudo...
Para falar da comunidade, não mais posso me basear em fatos ou dados históricos, de modo que o texto terá de ter uma visão mais pessoal à partir deste momento. Existe, atualmente, um certo "desinteresse" da comunidade fã de anime e mangá em Portugal. Talvez, seja mais correto dizer que existe uma clara divisão. Para aqueles que são "fãs de animação e/ou mangás" em terras lusitanas, a situação é um tanto quanto preocupante. O maior portal do País está praticamente abandonado, a administração demonstra pouco interesse em mudar isto e o fórum vive (cada vez mais) apenas de pontuais posts sobre uma ou duas séries mais populares e que conseguiram alguma penetração no mainstream, como Naruto e One Piece. Os grandes entusiastas parecem ter simplesmente desistido de participar nesses lugares, e têm pequenos canais de IRC ou grupos de Facebook para discutir qualquer coisa à respeito do tema.

A situação se agrava ainda mais, quando se leva em consideração a não existência de um mercado. Não é possível "culpar" os novos fãs, que apenas têm interesse nas séries mais populares, pois os mesmos não têm acesso a mais nada nos meios de comunicação conhecidos. Assim, a cada ano que passa, os entusiastas e este novo grupo de "fãs casuais" se distanciam cada vez mais, e isto começa a ser notório até mesmo em eventos organizados no território português.

Um dos pontos que mais me chama a atenção, nos grandes eventos organizados hoje em dia em Portugal, é a quase completa ausência do dito anime nos mesmos. A programação conta com todo o tipo de coisas, com campeonatos de cosplay, competições de videogames, shows de música, áreas dedicadas a Vocaloid, workshops e stands dedicados à venda de merchandising, enfim, a variedade é muita. Mas, ainda assim, há sempre aquela omissão gritante sobre uma mostra de anime que seja. Para uma festa que é, teoricamente, dedicada à disseminação da animação japonesa, estes encontros cada vez mais fazem um trabalho pior na divulgação daquele que deveria ser o produto mais importante.

Guerreiras Mágicas de Rayearth, também presente no fandom lusitano.
Filipe Jesus, que fez parte do comitê de organização de diversos eventos, dá um panorama geral sobre esta nova fase em Portugal.

Acho que a grande mudança aconteceu em 2009 com o Iberanime, e a 'vinda' da Comicon em Portugal veio a revolucionar as coisas. A Comicon este ano contou com cinquenta mil visitantes, e o Iberanime vai ser já no Pavilhão Atlântico no próximo ano. Isto tudo somado à febre mainstream por séries e jogos tipo League of Legends tem trazido imensos números e novos cosplayers. Além disso, de fato não existe mais um foco na mostra e divulgação dos animes, em si, com atividades que dele se insurgem. Aqui encontram-se a venda de merchandise, a febre dos AMVs, e, acima de tudo, o cosplay, que, como dito anteriormente, têm ganhado muita força também por conta da comunidade dos videojogos. Porém, não é como se não existissem outros eventos menores. Algumas pessoas ainda organizam coisas mais 'intimistas', mas têm dificuldade em cativar o público, explica.

Assim, está criada uma estranha situação. De um lado, a animação japonesa e os mangás estão mais populares do que nunca, no País, quando eventos como o Iberanime alcançam números expressivos, mas, por outro, a comunidade em si parece estar mais dispersa. Os “fãs” que surgem, e que são em grande número, contentam-se apenas em consumir os produtos mais mainstream, mas não demonstram interesse em ir mais a fundo dentro deste universo.

O NETOIN! agradece muito ao jovem Luís
pela sua importante e completa participação, 
nesta série de posts especiais pelo
nono aniversário deste lar na internet.

Até a próxima!

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[ made in NETOIN! ]


Conheça o jovem convidado, visitante...

Luís, mais conhecido como "Blue", é um grande fã de animação japonesa, especialmente das seiyus. Adorador de obras como Symphogear e Gundam, o rapaz está sempre pronto para dar a sua opinião sobre o tema.

2 comentários:

  1. Muito bacana esse seu post, tenho uma amiga de portugal ela vive me falando como é difícil encontrar mangás para comprar lá mesmo, ela fala que apenas encontra publicações mais mainstream como dito no post, no máximo o que ela achou de diferencial foi um mangá de Vampire Knight, muito bom conhecer a história de como o anime se introduziu em Portugal.

    Uma curiosidade interessante é que não sei se é feito por fãs, mas já presenciei diversas obras dos anos 80 e até Fairy tail dublado em português de Portugal.

    Espero que com o tempo crie-se um famdom maior de animes e mangás mais cult em portugal.
    o/

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    Respostas
    1. Saudações


      Este post, feito pelo nobre amigo Luís, retrata muito bem a situação vivida pelos fãs de animes e mangás em Portugal. É um tema que tem de ser levado em consideração, além de ser estudado com calma.

      Assim torcemos, todos, nobre.


      Até mais!

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